sexta-feira, março 21, 2008

Cultura à sexta

Eu quero amar, amar perdidamente!
Amar só por amar: aqui... além...
Mais Este e Aquele, o Outro e toda a gente...
Amar! Amar! E não amar ninguém!

Recordar? Esquecer? Indiferente!...
Prender ou desprender? É mal? É bem?
Quem disser que se pode amar alguém
Durante a vida inteira é porque mente!

Há uma primavera em cada vida:
É preciso cantá-la assim florida,
Pois se Deus nos deu voz, foi pra cantar!

E se um dia hei-de ser pó, cinza e nada
Que seja a minha noite uma alvorada,
Que me saiba perder... pra me encontrar...


Florbela Espanca, um dos maiores nomes femininos da poesia portuguesa nasceu, bastarda, a 8 de Dezembro de 1894 em Vila Viçosa e morreu, 36 anos mais tarde, nesse mesmo dia, em Matosinhos, num suicídio oportunamente convertido em "edema pulmonar" pela família que queria evitar o escândalo e a desonra desse acto considerado infame.

Durante toda a sua vida, tanto com a sua obra como com o seu exemplo, Florbela Espanca testou os limite da moralidade e provocou a sociedade com os seus comportamentos, considerados por uns como levianos, e por outros apenas como intensos e apaixonados. Infeliz nos seus três casamentos, nunca se cansou, porém, de cantar o amor e a paixão que tanto ansiava e desejava. Os seus poemas, aliás, têm como temática quase exclusiva o amor, a paixão, a saudade, a solidão, o sofrimento e a análise exaustiva e quase obsessiva do seu «eu». A sua obra embora riquíssima e de uma beleza formal irrepreensível, marcadamente influenciada por Antero de Quental no uso do soneto, não teve grande aceitação no seu tempo de vida, por um lado por se considerar que era demasiado intensa e sensual, quase erótica, e por outro por se afastar das correntes que então se desenvolviam, nomeadamente o modernismo e o futurismo, sendo que Florbela era marcadamente uma "neo-romântica".

Poetisa de excessos, cultivou exacerbadamente a paixão e não se lhe conhece qualquer opinião sobre o mundo, a sociedade ou a política (embora o Estado Novo a tenha considerado como uma escritora non grata pela temática pouco ortodoxa da sua obra). Centrou a sua obra nos sentimentos e em torná-los palavras com sentido e assim criou alguns dos mais belos poemas portugueses.

Profundamente melancólica e depressiva, vítima dos seus excessos e de uma vida que nem sempre lhe foi fácil (passou por dois divórcios, sofreu dois abortos e perdeu o irmão que adorava num acidente de avião) acabou por ceder à depressão e à doença mental (hoje pensa-se que Florbela sofreria de doença bipolar) e suicidou-se no dia em que fazia 36 anos, com uma dose fatal de barbitúricos.

Em vida apenas publicou duas obras - o Livro de Mágoas (1919) e o Livro de Sóror Saudade (1923) sendo que a sua obra prima, Charneca em Flor, seria publicada em Janeiro de 1931, já postumamente. Florbela, à semelhança de outros escritores e artistas, não teve em vida o reconhecimento da sua obra...

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